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Quando a educação é interrompida pelo tabu

  • Jessica Alves
  • 17 de nov. de 2017
  • 3 min de leitura

Mônica Waldhelm é professora de ciências biológicas, doutora em educação e mãe de um rapaz, de 22 anos. Para Mônica criar e educar uma criança não é uma tarefa fácil, mas nada a impediu de realizar tal tarefa com seu filho e também sua irmã (20 anos) mais nova.

Quando surge a primeira pergunta de sexualidade é difícil não sentir um pouco de desconforto não é mesmo? Mas, a professora, que entende muito bem do tema, conta que é preciso responder diretamente e claramente à pergunta do filho. “Nada a mais, nem nada a menos”. É preciso ser franco para criar um laço de confiança entre pais e filhos.

Falar de sexualidade com os filhos precisa se tornar um hábito entre os pais. O assunto tem cada dia mais visibilidade na mídia e já que está sendo tratado abertamente na rua, precisa deixar de ser um tabu dentro de casa.

A Mônica é também autora de um dos livros de ciências do Projeto Apoema, uma coleção de livros da Editora do Brasil, que tem carrega no nome, original da língua tupi, o significado: aquele que vê mais longe. Este mesmo livro, no início do ano, gerou polêmica com pais de alunos da Escola Estadual Júlio Guerra em Ji-Paraná, uma cidade localizada em Rondônia.

Apesar de a obra ter sido indicada pelo Ministério da Educação (MEC) e aprovada pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) em 2017 alguns pais criticaram a abordagem do tema sexualidade no livro para os alunos do 8º ano.

Como você descobriu sobre a intolerância dos pais a respeito do conteúdo divulgado no livro?

Primeiro eu fui avisada pela editora e depois pude ver mais detalhes acessando as notícias na internet.

Além das imagens, os pais insinuaram que o texto estimulava a sexualidade precoce. Na sua opinião o que levou os pais a reclamarem disso?

Houve um equívoco na interpretação de textos. Palavras e frases fora de contexto foram citadas de forma a distorcerem totalmente o conteúdo do livro sobre o tema. As imagens utilizadas são realistas (embora sejam em sua maioria desenhos e não fotos) e isto também incomoda a muita gente. A representação de órgãos sexuais do corpo humano parece chocar a quem só aprendeu com imagens em cortes e raios x. Sempre optamos por um corpo no qual o(a) estudante pudesse se reconhecer.

De todos os comentários feitos qual foi o que mais lhe chocou?

Fiquei realmente espantada em ver que a sequência de desenhos que instruía o autoexame da mama havia sido considerada uma insinuação de masturbação feminina.

Como você contornou essa polêmica?

Divulguei o caso nas redes sociais incluindo os textos e imagens originais do livro. Achei a questão da tentativa de censura tão grave que exigia uma problematização por parte da sociedade. Entrei em contato com a jornalista Eliane Brum que me entrevistou. Daí foi publicado o artigo Escola sem Pinto (pelo jornal El País) que ampliou o debate para todo um contexto conservador no Brasil atual. Também enviei aos professores da escola de Rondônia a nota de repúdio e o parecer da Sociedade Brasileira de Ensino de Ciências sobre o caso, para apoiá-los.

Como foi para a editora? Houve algum momento em que eles concordaram com os pais?

A editora agiu com calma e sem alarde, optando por tomar providências jurídicas apenas se fosse necessário. Recebemos apoio total como autores do livro. E como o livro foi aprovado no PNLD e sabíamos do cuidado com que foi escrito e produzido, ficamos tranquilos ainda que muito chateados.

E diante de tudo isso qual a sua opinião em relação à educação sexual dada em salas de aula?

Deveria ser abordada de modo interdisciplinar e problematizado. Infelizmente ainda acaba restrita -na maioria das vezes- a doenças e gravidez na adolescência. O enfoque socioemocional geralmente é ofuscado pelos aspectos biológicos. Ignora-se a dimensão prazerosa e ressalta-se o medo, achando-se que assim pode-se reprimir o desejo e abafar temas polêmicos entre os adolescentes.

Você acha que os pais estão preparados para passar um conteúdo claro, educativo e preventivo sobre o tema?

Muitos pais não se sentem à vontade para este tipo de conversa. Seja por inibição, questões religiosas e até desconhecimento de certos temas. Mas se existir realmente vontade de conversar, pode-se buscar ajuda na escola, no posto de saúde, em livros, materiais didáticos, sites e filmes educativos adequados à idade dos filhos . Creio que mesmo quando as famílias tomam atitudes equivocadas, existe o sentimento de estar fazendo o melhor para seus filhos. Não cabe aqui recriminação, mas busca de diálogo e parceria com as famílias.


 
 
 

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